Portão Doméstico
Chove forte. Chove. Tão intensamente como o ritmo em que meu sangue pulsa enquanto eu termino minhas malas. No espelho eu observo meus lábios ressecados, descoloridos e de algum modo eu pareço um pouco mais velha, um pouco mais fria, como a chuva lá fora. Eu respiro profundamente, com cuidado prendo a franja nova em um grampo estampado com a minha cor interna. Mais uma olhada rápida e me vou; desejando descobrir por que estou indo. Entro no carro e respiro o cheiro maturado de almíscar. A chuva embaçou o vidro e minha única preocupação é colocar o som no lugar certo e encher meus ouvidos de uma melodia conhecida que me faz querer berrar ao som do meu próprio ritmo. Isso me tranquiliza durante o caminho molhado. No alto da madrugada eu já estou voando, e a única coisa que eu vejo é um negrume infinito, apesar de o comandante ter avisado que a chuva não nos atrapalhará. E no mais real déjà vu , eu vejo a poltrona vazia e com um grande passo chego mais e mais perto. Meu corpo inteiro s...