os primeiros dias
Eu me senti tão nostálgica hoje. Coisas pequenas do meu dia-a-dia têm me feito chorar como uma criança perdida na quermesse. O calor desses dias tem estado opressivo e me sinto oprimida. Tenho vontade de andar com abandono pelas próximas horas, fumando um cigarro atrás do outro, escondendo meus olhos inchados por trás das de um Marc Jacobs com aro de tartaruga que me deixa com ar de ressacada.
Parece estranho, mas essa sou eu. Olhando para alto enquanto as árvores balançam ao sabor do vento e logo em seguida dou três ou quatro tropeções na calçada de pedras portuguesas. Os taxistas riem. Eu ignoro. Meu tornozelo parece estranho por um momento, mas eu ignoro. Algumas pessoas na praça olham, e eu ignoro. Hoje é um desses dias. Down the memory Lane*. Eu gosto dessa expressão. Me faz lembrar dos dias em Londres e como eu andava por horas esperando que meu peito se esvaziasse de alguma forma da saudade de casa.
Me faz lembrar dos dias nebulosos, mas eles não se comparam aos nebulosos dias dessa cidade tropical. Aqui, o céu nunca parece baixo e por mais cinza, essa umidade grudenta nunca deixa a pele; ela fica em volta e quando se respira o cheiro de mato, de folha, está lá. Se eu estivesse em Westminster, entrando e saindo das ruas residenciais, respirando o ar espesso e opaco como uma cortina de fumaça e poluição – o que isto é na verdade – eu provavelmente não sentiria cheio de nada. E eu desejaria esse cheiro de terra, de folha, como nunca.
Agora é o contrário. Eu vago pela minha cidade natal com o peito cheiro de tristezas e saudades de um tempo tão confuso que nem sequer posso lhe dar um nome. Eu subo as ruas residências do meu bairro burguês olhando as garotinhas usando shorts jeans e óculos que parecem duas vezes maior do que o rosto de qualquer uma delas. E eu penso nas senhoras que usam pulôver.
Eu só vejo as diferenças, do meu mundo e do tempo. Mas eu desejo que não fosse tão sentimentalista. Eu não sou esses mundos, sou apenas eu mesma. Sou feita dessas memórias escondidas em cada passo que dou nesse Converse desconfortável. Sou essas camisetas grandes que uso, tomadas das pessoas que eu mais quis ter perto de mim. Sou esse jeito de empurrar os óculos por baixo com o dedo médio – um gesto que comecei a imitar da minha avó sem perceber.
Sou as experiências do mundo que deixei para trás e que passo nessa minha cidade quente. É aqui que me encontro. É onde minhas memórias são mais vivas e eu as guardo com tanto, tanto carinho... e ás vezes tanto pesar que eu decido escrevê-las ao menos uma vez.
Não sei se pelo fato de mais um aniversário em família estar se aproximando ou se é só idade. Se são esses momentos ao lado da minha avó, enquanto ela me conta sobre pessoas que eu nunca conheci, de momentos que eu era nova demais para lembrar ou simplesmente coisas que eu ainda não sei. Esses momentos pequenos sobre a vida e eu me pego pensando com quem eu vou compartilhar essas memórias e se eu sequer vou ser capaz de retê-las comigo para sempre. Então antes que e a velhice ou a doença as roube de mim, eu prometo que vou escrevê-las.
Talvez ninguém as leia. Quem quererá saber? E de alguma forma isso me acalma. Não me dá a segurança que eu procuro, não é como um livro que alguém vá ler, uma música que alguém vá escutar, ou um filme que alguém vá ver. Mas é a espécie de agradecimento que eu posso dar ao mundo por ter estado aqui. Pois é exatamente dessa forma que eu vejo meus mundos. Essas faces de mim mesma. E de alguma forma, sinto meu peito mais leve.
shelhass
Baseada na música Hometown Glory por Adele. E de uma forma ou de outra, inspirada pelas incríveis 9 horas seguidas lendo One Day de David Nicholls.
*do inglês: aproximadamente “descendo pela rua da Lembrança”.
Parece estranho, mas essa sou eu. Olhando para alto enquanto as árvores balançam ao sabor do vento e logo em seguida dou três ou quatro tropeções na calçada de pedras portuguesas. Os taxistas riem. Eu ignoro. Meu tornozelo parece estranho por um momento, mas eu ignoro. Algumas pessoas na praça olham, e eu ignoro. Hoje é um desses dias. Down the memory Lane*. Eu gosto dessa expressão. Me faz lembrar dos dias em Londres e como eu andava por horas esperando que meu peito se esvaziasse de alguma forma da saudade de casa.
Me faz lembrar dos dias nebulosos, mas eles não se comparam aos nebulosos dias dessa cidade tropical. Aqui, o céu nunca parece baixo e por mais cinza, essa umidade grudenta nunca deixa a pele; ela fica em volta e quando se respira o cheiro de mato, de folha, está lá. Se eu estivesse em Westminster, entrando e saindo das ruas residenciais, respirando o ar espesso e opaco como uma cortina de fumaça e poluição – o que isto é na verdade – eu provavelmente não sentiria cheio de nada. E eu desejaria esse cheiro de terra, de folha, como nunca.
Agora é o contrário. Eu vago pela minha cidade natal com o peito cheiro de tristezas e saudades de um tempo tão confuso que nem sequer posso lhe dar um nome. Eu subo as ruas residências do meu bairro burguês olhando as garotinhas usando shorts jeans e óculos que parecem duas vezes maior do que o rosto de qualquer uma delas. E eu penso nas senhoras que usam pulôver.
Eu só vejo as diferenças, do meu mundo e do tempo. Mas eu desejo que não fosse tão sentimentalista. Eu não sou esses mundos, sou apenas eu mesma. Sou feita dessas memórias escondidas em cada passo que dou nesse Converse desconfortável. Sou essas camisetas grandes que uso, tomadas das pessoas que eu mais quis ter perto de mim. Sou esse jeito de empurrar os óculos por baixo com o dedo médio – um gesto que comecei a imitar da minha avó sem perceber.
Sou as experiências do mundo que deixei para trás e que passo nessa minha cidade quente. É aqui que me encontro. É onde minhas memórias são mais vivas e eu as guardo com tanto, tanto carinho... e ás vezes tanto pesar que eu decido escrevê-las ao menos uma vez.
Não sei se pelo fato de mais um aniversário em família estar se aproximando ou se é só idade. Se são esses momentos ao lado da minha avó, enquanto ela me conta sobre pessoas que eu nunca conheci, de momentos que eu era nova demais para lembrar ou simplesmente coisas que eu ainda não sei. Esses momentos pequenos sobre a vida e eu me pego pensando com quem eu vou compartilhar essas memórias e se eu sequer vou ser capaz de retê-las comigo para sempre. Então antes que e a velhice ou a doença as roube de mim, eu prometo que vou escrevê-las.
Talvez ninguém as leia. Quem quererá saber? E de alguma forma isso me acalma. Não me dá a segurança que eu procuro, não é como um livro que alguém vá ler, uma música que alguém vá escutar, ou um filme que alguém vá ver. Mas é a espécie de agradecimento que eu posso dar ao mundo por ter estado aqui. Pois é exatamente dessa forma que eu vejo meus mundos. Essas faces de mim mesma. E de alguma forma, sinto meu peito mais leve.
shelhass
Baseada na música Hometown Glory por Adele. E de uma forma ou de outra, inspirada pelas incríveis 9 horas seguidas lendo One Day de David Nicholls.
*do inglês: aproximadamente “descendo pela rua da Lembrança”.
Comentários
Engraçado, ouça aquela música do Death Cab for Cutie que eu coloquei na lista, "You Are a Tourist", de alguma forma tem bastante a ver com o seu texto!
E quanto ao livro, minha namorada ganhou de presente! dizem que é triste, não? acho que ela vai gostar :))
bjsss, bom fim de semana!