Migalhas

(A pedido de Daniel)

Em um quarto esquecido de beira de estrada duas pessoas dividem um colchão carcomido que range ao menor sinal de movimento. Do lado direito, encolhida em posição fetal, lágrimas silenciosas escorrem de seus olhos fechados - qualquer um poderia supor que ela está dormindo se sua respiração não estivesse tão errática.
Sua mente está repleta de imagens de quase cinco anos. Os braços seguramente apertados na cintura dele, com o vento movendo seus cabelos longos de cor intensa. Apesar do medo que sentia de se arrebentar nalguma barreira de concreto não pôde deixar de se sentir feliz, deixando tudo para trás, voando velozmente com seu sonho em volta dos braços.
No extremo oposto, deitado de lado dando-lhe as costas, ele pisca a cada cinco ou seis segundos para uma pequena infiltração que se espalhava vagarosamente pela parede, mesmo que ele ainda não tenha percebido.
Na verdade, seus pensamentos estão focados em algum lugar das últimas cinco horas, quando acidentalmente viu-se novamente olhando para o passado.
Mesmo que ele não estivesse à procura de algo, pôde ver o incontrolável espírito jovem de 19 anos que vive dentro de alguém que ele não reconhece em volta dos olhos que já mostram delicados sinais da idade, ao se ver no espelho.
Lá fora o sol já não é visto atrás das colinas. Enquanto mais um dia de dezembro se vai seus dedos enfraquecem do aperto seguro dos primeiros anos. Ela está cansada dos sonhos que ou não são mais como eram ou não se realizaram ao passo que ele procura entender como se tornou esse alguém desconhecido.
Cada um a seu modo aprendeu que a luz se foi e como a escuridão que entra pela janela aberta, fria e familiar, eles se dão boa noite, acomodados ao silêncio que os abate depois que os desejos são satisfeitos, deitados cada um de um lado, repartindo fraternalmente a única coisa que ainda os mantém unidos.

shelhass
Baseada na música Brothers On A Hotel Bed por Death Cab For Cutie.
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Importante: Daniel me fez este pedido há algum tempo, mas na época não pude atende-lo por isso é o primeiro conto que posto este ano, numa tentativa cínica para me redimir.